quinta-feira, abril 13, 2006

O contrabaixo.

Todos os dias ela fazia o mesmo. Saía do seu emprego no banco (bem remunerado, mas sem qualquer interesse) e metia-se no metro (porque era mais rápido do que ir de carro). No metro não olhava para ninguém e ninguém olhava para ela (ninguém se olha no metro). Saía do metro e sentava-se n'"A Brasileira" a beber um café e a comer qualquer coisa, sem que sentisse qualquer sabor. Depois entrava no seu apartamento na Rua Serpa Pinto e descalçava os sapatos que deixava num sítio qualquer, punha uma música qualquer (daquelas vazias e sem emoção), e lia o jornal, só para ter tema de conversa no banco, pois as notícias não a emocionavam. Às vezes ia à janela e olhava para as pessoas lá fora. Mal distinguia as cores, via tudo tão cinzento, tão desprovido de vida. Da janela ia para o sofá e via uma série cómica qualquer, sem que lhe desse qualquer vontade de rir (quanto mais de sorrir).

Até que um dia começou a ouvir um contrabaixo no andar de cima. Quem seria? Um músico conhecido? Um jovem estudante? A sua rotina mudou completamente. Entrava no apartamento e descalçava-se descontraidamente, enchia um copo com bom whiskey (que começou a aprender a saborear) e sentava-se no sofá. Não ia à janela nem abria o jornal, ficava ali sentada, de copo na mão, a ouvir a música que vinha do andar de cima. De vez em quando o contrabaixo parava e repetia algum compasso mais teimoso ou arranhava algum ornamento mais difícil. Ela começou, as poucos, a dar mais atenção a tudo à sua volta. E começou a sentir outra vez. A música daquele contrabaixo despertou-a de um longo sono que tinha durado muito tempo e lhe tinha tornado os dias cinzentos. A música daquele contrabaixo, com toda a sua emoção, com todas as suas imperfeições (tão humanas), fê-la voltar à vida, devagarinho.O contrabaixo destruiu-lhe os dias cinzentos.

Um dia, no elevador, viu um homem com um contrabaixo às costas. O contrabaixo era maior que ele. Como é que aquele instrumento grotesco podia emitir uma melodia tão bela?
Ela procurou a emoção das músicas que ouvia no rosto, nos olhos do homem. Mas aqueles olhos verdes eram frios como gelo. Indiferentes ao mundo. Sem um pingo de emoção.

Também o contrabaixista procurava algo que lhe destruísse os dias cinzentos.

Framboise

7 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Tou a pensar em ir beber um chá... talvez mandar um mail á Framboise para ela me pôr no hi5 ou numa marikisse dessas, isso é ke me puña no cinzento num instante heheheeh ^_^


(uhhh ouvi dizer ke até vou ter um link na pagina principal, ena ena tou a ver que finalmente o spam todo tá a resultar)

12:15 da manhã  
Blogger the dreamer said...

Sabes q eu, tal como tu, sou boa mentirosa?

Coisinha inócua...

1:17 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

ena ena, gostava de saber onde é que me viste a mentir, uma coisa é dizeres outra é provares, porque acima de tudo as miñas mentiras são frugais, difamação não é coisa inocua...

11:39 da manhã  
Blogger the dreamer said...

Eu não te estou a difamar. Tu próprio o disseste.

Já agora. Vai palhaçar para outro post. Não neste se faz favor.

4:50 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Bah, nem vale a pena, continuas a distorcer as miñas palavras e se eu não posso comentar neste, não existe razão para o fazer em mais algum...

12:24 da manhã  
Blogger the dreamer said...

Não sei onde distorci as tuas plavaras, mas de qualquer forma peço desculpa.

1:45 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Um belo texto! Só mesmo a música para despertar emoções e sentimentos... Eu vivo rodeada de música (e músicos) raramente o silêncio se faz ouvir mas, quando isso acontece um grande vazio sem expressão inunda-me...

Abraços!

7:27 da tarde  

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